segunda-feira, 27 de julho de 2020

Quarentena já era


Cerca de mil brasileiros morrem todo dia, vítimas da covid-19. Porém, parece que a população começa a ignorar essa estatística e achar natural essa mortandade. A classe média começa a reocupar os shoppings e a classe baixa invade as praias sem medo de ser feliz, como mostra, de forma gritante, a foto de capa do Diário do Pará, de hoje.

Parece que a quarentena ainda é realidade apenas para uns poucos, considerados "medrosos" ou "superprudentes". A maioria prefere mesmo retomar de vez a vida normal.

Presos podem vir a trabalhar para bancar custos

A situação carcerária brasileira é precária, com superlotação e alto custo para o estado. O governo tem um projeto para privatizar presídios e fazer os presos trabalharem e usarem parte do salário para pagar seus custos. "Hoje é o pior dos mundos, e o modelo de parceria público privada (PPP) pode ajudar a inverter esse cenário", afirmou, em entrevista ao UOL, a secretária especial do Programas de Parcerias de Investimentos (PP) do Ministério da Economia, Martha Seillier.

Olha que não é uma má ideia, que pode beneficiar tanto presos, que podem ter uma renda extra, ocupação e pena reduzida, quanto o Estado, que deixaria de ter um alto custo, ineficiente e que produz situações desumanas e sem perspectivas para os presidiários.
A situação carcerária brasileira é precária, com superlotação e alto custo para o estado. O governo tem um projeto para privatizar presídios e fazer os presos trabalharem e usarem parte do salário para pagar seus custos. "Hoje é o pior dos mundos, e o modelo de parceria público privada (PPP) pode ajudar a inverter esse cenário", afirmou, em entrevista ao UOL, a secretária especial do Programas de Parcerias de Investimentos (PP) do Ministério da Economia, Martha Seillier.... - Veja mais em https://economia.uol.com.br/colunas/carla-araujo/2020/07/27/governo-quer-presidios-privados-ppp-presos-trabalhando-e-remunerados.htm?cmpid=copiaecola

Dica Musical: Delerium, música eletrônica da melhor qualidade

Bom dia, pessoal. Mais uma seção criada pelo blog, onde estarei dando dicas e informações de músicos, bandas, projetos e gêneros musicais, quase sempre disponibilizando as faixas apresentadas para os interessados, ou o próprio álbum, se tiver disponível.

Nesta primeira matéria, gostaria de apresentar uma dupla musical canadense chamada Delerium. Na verdade, trata-se de um projeto, pois cada álbum envolve novos músicos convidados.

Dois aspectos me chamaram a atenção nesse grupo: o primeiro é que se trata de música eletrônica da melhor qualidade. O segundo é que produz um estilo de música dos mais variados e híbridos que já vi.

Sua base é a música eletrônica, a caminho do trance, mas introduz elementos de outros gêneros como da new age, da world music e world beat. (Pra quem não conhece, vou estar falando desses gêneros nas próximas postagens).

A música que escolhi para compartilhar com vocês hoje, Duende, tem elementos de música indígena e hindu, é executada pela cantora canadense Camille Henderson e faz parte do álbum Karma.


Os interessados por esta ou outra faixa do grupo, é só deixar comentário ao final da postagem ou enviar e-mail para johncharlespa@gmail.com.

domingo, 26 de julho de 2020

Artigo da Semana: Por que o mito ainda não se quebrou?

Imagem: REUTERS/Adriano Machado.
Em cabeça de eleitor, nem sempre dois mais dois são quatro.

Apesar de todas as trapalhadas, leviandades, zombarias, bravatas, descasos e atrocidades cometidas à frente da Presidência da República, se a eleição fosse hoje, Jair Bolsonaro estaria eleito.

Pesquisa exclusiva da revista Veja, realizada pelo instituto Paraná entre os dias 18 e 21 de julho, mostra que Bolsonaro lidera em todos os cenários de primeiro turno, com percentuais que vão de 27,5% a 30,7% e derrotaria os seis potenciais adversários no segundo turno: Lula e Haddad (PT), Ciro Gomes (PDT), João Doria (PSDB), Sergio Moro e Luciano Huck.

Ou seja, apesar de já poder ser considerado um dos piores presidentes brasileiros em menos de metade do seu mandato (e eu poderia listar inúmeros motivos para isso, mas vou me limitar ao descaso de Bolsonaro com a pandemia e à péssima imagem internacional do país), uma coisa é certa: o “mito” ainda não se quebrou; e também ainda não foi quebrado.

É claro que a popularidade de Bolsonaro está longe de atingir os 83% de Lula, no auge de seus dois mandatos, ou os 64% de Dilma Roussef, em seu primeiro mandato, em 2012. Mas, depois de tudo de ruim que aconteceu nos últimos meses - inclusive a ameaça de impeachment que ainda paira sob si e depende da apuração de inquéritos e processos em andamento -, Bolsonaro já poderia estar eliminado eleitoralmente. Só que não. Ele resiste, não tão forte, mas firme.

É uma situação que pode ser comparada à de Lula no auge do mensalão, em 2005, episódio que, apesar de toda a repercussão negativa na época, não foi suficiente para ferir de morte sua popularidade, tanto é que conseguiu reeleger-se no ano seguinte, e posteriormente fazer sua sucessora petista.

Do alto da minha humildade de professor e jornalista nas horas vagas, atribuo esse paradoxo a três fatores, de naturezas diferentes: cultural, política e econômica.

O primeiro tem a ver com a cultura permissiva do cidadão brasileiro, que poderia ser simplificada em alguns ditados do tipo: “ruim com ele, pior sem ele”, “rouba, mas faz”, “o outro fez pior”, etc. Nosso “pacato cidadão” não é chegado a rupturas ou ao enfrentamento. Um grande exemplo é a luta contra o racismo, que atualmente ganha força nos Estados Unidos e em outros países no mundo, enquanto que no Brasil, assistimos praticamente todo dia à violência contra a população negra, inclusive com mortes. Protestos raramente acontecem, e quando acontece é com uma participação ínfima. É claro que essa mesma permissividade tem livrado a cara de vários políticos ao longo de nossa história republicana. Bolsonaro é só mais um.

O segundo é de ordem política. Bolsonaro tem apoio irredutível e consciente de uma base social coesa e consolidada: trata-se de grande parte da elite social e econômica brasileira, o cidadão que tem dinheiro pra gastar e dedicar seu tempo às redes sociais, formando opinião e dando a linha para os que estão no andar de baixo (muitas vezes seus próprios empregados), ou seja, o povão desinformado, que ainda se ilude e se identifica com as falas autoritárias e salvacionistas do “mito”. Para esse setor mais vulnerável (inclusive do ponto de vista educacional), certamente o auxílio emergencial de 600 reais aprovado pelo Congresso e pago por dever de ofício pelo governo federal veio conter uma inevitável sangria eleitoral bolsonarista. Aqui é impossível não se fazer um paralelo com os efeitos do Bolsa-Família, mesmo reconhecendo tratar-se de iniciativas de natureza diferente.

Um terceiro fator que enumero aqui é o discurso negacionista de Bolsonaro, que desde o início da pandemia no Brasil manifestou-se firmemente contra o isolamento social, ainda que isso viesse a custar milhares de vida. Se engana quem pensa que o povão viu e vê com maus olhos esse discurso.

Uma parte reduzida da classe média bateu panela logo no início, depois cansou. O povão, como sempre, pagou pra ver. Afinal, a ânsia de abandonar o isolamento sempre foi um fato, seja por razões comportamentais (pois permanecer enclausurado em casa para um pobre no Brasil é muito mais penoso do que para alguém da classe média ou alta), seja por necessidades financeiras, para correr atrás do pão de cada dia. Tais fragilidades sociais deram eco ao discurso negacionista de Bolsonaro. E continuam dando.

Talvez, diferentemente do que diz a Veja, Bolsonaro não seja um “fenômeno político”. Talvez ele esteja somente fazendo e falando o que a maior parte da população brasileira quer ouvir.

Cabe aos seus adversários, daqui a dois anos e meio, mostrar que não é Bolsonaro que está errado, mas a própria perspectiva de seus eleitores, principalmente daqueles que estão tendo uma perspectiva distorcida e atrasada de sociedade.

Entretanto, se nada mudar, só me resta concordar com o ditado de minha finada e sabida avó: “Quem morre de gosto não fede”.

JCT.

Rock de motel

Sabe aquela música que você ouve a primeira vez e não quer mais parar de ouvir, podendo até passar uma tarde ou uma manhã toda ouvindo?

Pois é, a música aí embaixo é uma delas. Chama-se Superstar e é de uma banda de rock alternativo chamada Sonic Youth. Eu as descobri num filme chamado Juno, uma comédia romântica de 2007 e logo me tornei fã de carteirinha da banda. Costumo dizer que essa música é uma mistura de rock com música de motel, no estilo daquela música francesa Emanuelle (quem é mais coroa sabe muito bem do que estou falando).

Quem se der ao trabalho de conhecer um pouco mais do Sonic Youth vai perceber que a música é praticamente um ponto fora da curva no repertório da banda. É uma daquelas baladas que os roqueiros compõem quando já estão de saco cheio de tanta barulheira e distorção.

A banda é uma das minhas queridinhas e das que mais ouço atualmente, e a música, o que dizer, além de ter preenchido muitos minutos monótonos em algumas filas de espera ou viagens de ônibus. Espero que gostem.

Live carnavalesca: Hoje é dia de samba paraense ao vivo

Diz o ditado: "Quem não gosta de samba bom sujeito não é". Não sei se é verdade, mas sei que a nata do samba paraense estará reunida hoje à tarde, a partir das 15h, para promover a Live das Escolas de Samba paraenses.



O evento tem a coordenação das Escolas de Samba Associadas (ESA), liga que representa escolas do porte do Quem São Eles.

Assista Aqui:



Com o lema "Carnaval é necessário", o evento contará com a participação de cantores e músicos das escolas de samba do grupo especial do carnaval paraense e será transmitido ao vivo e simultaneamente pelo Youtube e Facebook.

Para participar, basta inscrever-se no canal da ESA no Youtube ou curtir a página da entidade no Facebook, conforme orientação abaixo.




Segundo o carnavalesco Glaucio Sapucaí, um dos organizadores da live, o objetivo do evento é "proporcionar momentos bem especiais preparados com bastante carinho para os amantes do samba e do carnaval paraense".

Então, é só gelar a cervejinha, o refri, a água e preparar o tira-gosto, e curtir o melhor do samba paraense da atualidade neste domingão de distanciamento social.

sábado, 25 de julho de 2020

Hora da Música Clássica: Barroco, Sebastian Bach

Inauguro hoje esta seção voltada àqueles que querem conhecer um pouco da chamada música clássica, um gênero muito ignorado pela grande maioria da população, mas que, pela sua riqueza artística e sua sofisticação técnica, pode contribuir em muito com o enriquecimento cultural e espiritual do ser humano, de uma forma universal, pois este é o verdadeiro caráter da boa música: ser universal.

Começo com o principal representante da época ou estilo barroco, Sebastian Bach. Trata-se de uma das épocas musicais de maior extensão, fecunda, revolucionária e importante da música ocidental, e provavelmente também a mais influente até hoje.

A primeira "música" é o Concerto para Violino em Lá Menor, com a performance da violinista alemã Julia Fischer, acompanhada pela orquestra Baltic Sea Youth Philharmonic, sob a direção do maestro Kristjan Järvi.

Espero que gostem dessa primeira experiência.

sexta-feira, 24 de julho de 2020

Eleições em Belém: Sai Úrsula, entra Orlando Reis

Informações dos bastidores políticos paraenses dão conta de que, com a desistência da secretaria estadual de Cultura, Úrsula Vidal, o vice-prefeito de Belém, Orlando Reis (foto), surge como o potencial candidato do governador Helder Barbalho à Prefeitura de Belém neste ano.


A preferência se justificaria por todo o apoio que o vice de Zenaldo vem dando a Helder, desde a época da campanha, quando rompeu de vez com o tucanato para pular para o barco emedebista.

Como em política as decisões nunca são bruscas ou definitivas, muito menos passionais, é bem possível que o governador espere o resultado das próximas pesquisas para confirmar o nome de Reis como seu candidato oficial.

Enquanto isso, nomes como o do deputado estadual Igor Normando (Podemos) também não estão descartados.

Live da sexta: Alcir Lobato canta Rita e Raul

Logo mais, às 22h, o músico paraense Alcir Lobato estará promovendo mais uma "live da sexta", direto do Conjunto Satélite, em Belém, para o mundo, através do Facebook. Na trilha sonora, músicas dos roqueiros Rita Lee e Raul Seixas.


Ubiratan Rosário, o homem que conversava com Deus em aramaico


Por João Carlos Pereira

A primeira vez que o vi foi em 1982. Ele vinha agoniado, em cima da hora para a aula de Cultura Brasileira, na Universidade. Alguém havia me prevenido que o homem era doido. Se quisessem que tivesse um ataque, uma crise no meio da sala, bastava arrastar a carteira no chão. O atrito do pé de ferro sobre a lajota o tiraria do sério. Meu cuidado era para não despertar nele a fera agoniado, invocar uma entidade enfezada. Mas a aula era tão boa, tão envolvente, que eu não conseguia ver nele o menor traço de alucinação. Sua fala apaixonada nos envolvia e a turma babava por seu enorme conhecimento.

Semanas se passaram, até que uma pessoa, doida para ver o circo pegar fogo, deliberadamente arrastou a carteira. José Ubiratan Rosário, a quem passei a tratar de Bira, porque tomávamos o mesmo ônibus e íamos conversando, não se atacou. Não pegou santo. Não virou bicho. Educadamente, disse que preferia que o aluno levantasse a cadeira. Era mais gentil. O mito estava desfeito.

Depois que as aulas acabaram, eu sempre passava por sua sala e lá estava ele, encantando os alunos. Tinha orgulho de ser professor e professor da Universidade. Nos reencontramos em Santarém, nas temporadas de interiorização. Não ficava com os outros professores no alojamento, onde o silêncio era raridade. Preferia a calma de seu hotelzinho, do qual, dizia, podia ver as estrelas pelos buracos do telhado. Foi ele quem me apresentou a música de Wilson Fonseca, que chamava “música de Santarém”. Nossa amizade solidificou-se diante do Tapajós.

O homem que amava ser professor, também escrevia sobre a Amazônia. Quando ganhou um prêmio da Academia Brasileira de Letras, sobre Belém, salvo engano, valorizou muito mais a presença e o discurso de Alceu Amoroso Lima para entregar-lhe a honraria do que a própria distinção. “Foi a última aparição dele em público”, gabava-se. Quando me candidatei a uma cadeira na Academia Paraense de Letras, abriu uma exceção para votar em mim. Por princípio, ninguém com menos de 50 anos deveria se candidatar. Na época, eu ainda ia fazer 42. Era um bebê.

Convivemos mais na Academia do que na Universidade. Ele não faltava nunca e engrandecia os debates com sua cultura universal. Ao morrer, com 71 anos, no dia 24 de outubro de 2009, não apenas não abriu apenas um vazio no coração da APL, onde ocupava a cadeira 28, como revelou, aos olhos da cidade, pelo caminho da ausência, a dimensão de sua importância. Eu gostava tanto dele que, quando o Pedro, secretário da Academia, ligou para avisar de sua morte, experimentei duas sensações: a de imensa tristeza, seguida de uma grande raiva. Raiva da morte. Raiva por ele haver partido. Diante de seu caixão, olhava para aquela cara, que parecia estar sorrindo, e perguntava: por que tu morreste, rapaz? Por que tu, logo tu, foste morrer? O sorriso era a resposta. Pudesse falar, diria: “morrer é nosso destino, João”.

Ubiratan – ou Bira - pertencia a uma rara – quase extinta – categoria de professores, cuja universalidade do saber o transformou em um ser humano especial, diferente. Unindo a sabedoria acadêmica a uma imensa simplicidade, conseguia um feito raro: mostrava a face alegre do conhecimento, sem precisar dizer que sabia. Simplesmente sabia.

Entre suas muitas qualidades, a de ser fiel à religião que abraçara talvez fosse a mais evidente. Católico fervoroso, nem sempre se contentava com as explicações que ouvia. Quando a razão não permitia o total entendimento de algum tema, depois de mergulhar nos textos fundamentais do cristianismo, rezava. E como rezava. Para exercitar a fé, alternava a sequência da “Ave, Maria” no santo terço. Começava em português, passava para italiano, avançava em francês ou inglês, alternava uma dezena em grego ou em russo. O “Pai Nosso” era recitado em aramaico, tal como Jesus o havia pronunciado.

Todos que tinham o privilégio de conversar sobre religião com José Ubiratan Rosário saiam com sensação de que haviam encontrado um sábio que dialogava com Deus. Se o assunto fosse outro, a idéia era a de que estávamos diante de um erudito, que tinha o dom de simplificar e não de complicar. Com ele, o saber ganhava sabor. Dava gosto vê-lo com as mãos cruzadas sobre a barriga e rezar uma “Ave, Maria” em russo. Caprichava no sotaque e abusava dos sons mais fortes. No céu, os santos deviam ficar confusos com tanto trancelê de idiomas. Imagino que as barreiras linguísticas se desfaçam, quando a palavra paira por sobre os telhados, antes mesmo de alcançar as nuvens. O caráter universal da verdadeira Igreja de Cristo reside, também, na pluralidade de idiomas em que suas orações são ditas todo dia, milhões de vezes, ao redor do mundo. Mas quando uma mesma criatura embaralha a reza, a situação se complica.

O homem sábio e cheio de fé era também uma pessoa do povo. Ele adorava as manifestações folclóricas e buscava no mais amplo conceito de cultura o guarda-chuva que abrigasse a expressão da busca de beleza nascida da criatividade popular. Era uma satisfação ouvi-lo explicar as origens desta ou daquela manifestação, bem como recuperar, no viés da história, fatos, datas e personagens que ajudavam a sedimentar a nacionalidade brasileira. Na voz do Bira, o tempo e os fatos se acomodavam de tal forma, que era possível entender o mundo no espaço de uma aula ou de uma disciplina que ministrasse.

A cultura de Ubiratan Rosário faz muita falta nesta época rasa e vulgar. Na Academia, sentávamos em bancadas diferentes: ele, na da esquerda de quem entra no plenário, e eu, na da direita. Nossas cadeiras estavam colocadas quase que uma diante da outra. Muitas vezes, nos anos que lá estou, nos comunicávamos com olhares, gestos e até bilhetes. Ao final das sessões, sobretudo das solenes, sempre ficávamos conversando. Quanto eu aprendi naqueles encontros festivos, que acabam se transformando em grandes aulas, já sem o medo que alguém arrastasse uma cadeira.

Brincalhão como pouca gente, criou um método para classificar as mulheres, tendo como medida os animais. Se a moça era dotada de pernas longas e cintura alta, apelidava de “menina-sapo”. A comparação, hoje, poderia ser vista como algo politicamente não muito correto, mas nos 80 fazia rir. Para cada tipo feminino havia uma fórmula. Em seu coração, o tipo ideal atendia pelo nome de Tininha, a sua Maria da Anunciação Rosário, que era uma espécie de orgulho secreto. Nunca soubemos como a classificava, mas era evidente o quanto a amava muito. Por muito tempo, depois de sua morte, a Tininha freqüentou a Academia e sentava sempre no mesmo lugar, na platéia, diante da cadeira do seu Bira. Não foram poucas as ocasiões em que a flagrei olhando para o espaço vazio, como se estivesse buscando a presença do amado ausente.

Uma vez, minha saudosa amiga professora Maria Annunciada Chaves me disse que o ruim de viver muito é que se vai vendo os amigos partirem. Ainda não vivi muito, apenas 61 anos, mas sinto que ainda falta tanta coisa para aprender, que necessito de longos anos pela frente. Deus sabe o quanto.

Claro que jamais acumularei o conhecimento de José Ubiratan Rosário, mas, pelo menos, posso dizer que o mundo ficou melhor, porque ele existiu entre nós.
 

(jcparis1959@gmail.com)